16.9.25

Com treze anos de idade, também eu sonhei que era uma contadora de histórias cheia de mágoas, de teimosia e de orgulho, e que o Robert Redford vinha de muito longe só para lavar os meus cabelos.

12.9.25

Com o tempo, desabituámo-nos de ter opiniões porque há quem seja pago para isso e nos liberte do desgaste do pensamento crítico. O que agora temos são, sobretudo, emoções. Sem história, sem conhecimento, sem lógica de raciocínio, autoridade, lucidez ou sustentação. Convertemo-las em verbo mal medido, publicamo-las a torto e a direito onde desenrascarmos um lugar, mesmo que seja exíguo e já esteja à pinha, impomo-las aos amigos nas conversas de esplanada, repetimo-las aos filhos travestidas de doutrina moral e adormecemos com o sentimento da mais absoluta dignidade e grandeza, sempre do lado bom. Que disso jamais se duvide: somos todos muito bons.

11.9.25

 — Uma pessoa não vai pra mais nova...
Ao lamento da mãe da rapariga da papelaria, dorida na curva do lombo como se — em palavras suas — um cão lhe cravasse os dentes, a cabeleireira acode com sabedoria aprendida a influencers graduados nas praias de Bali:
 Ora essa, dona Fatinha, uma pessoa vai para onde quiser. A idade está na cabeça. É aquilo a que se chama uma crença limitante.
Pela primeira vez, dona Fatinha, mãe de uma rapariga que só lhe dá desgostos, avó de uma catraia que ameaça despertar precocemente para a adolescência e multiplicar-lhe as consumições (disto contaremos em outra ocasião), mulher de coração governado por temores, de alegrias poucas e provisórias, tão poupada na ternura e cautelosa na esperança, toda entrincheirada nas malhinhas escuras da sua viuvez, dona Fatinha levanta o queixo, afia o olhar e apropria-se da razão:
 Isso tem algum jeito? Uma pessoa vai para onde pode e quando pode. E consigo não é diferente.
Mas a cabeleireira, que padece de certas formas modernas de cegueira e surdez, já vai lançada no sermão e segura da verdade. Ninguém a para, tem um rol de banalidades para desfiar. E, com uma arrogância bacoca, apregoa a poesia da maturidade, as "crenças limitantes" associadas ao envelhecimento, embora ela própria não consiga evitar pintar os cabelos, tenha desbotada lembrança da última noite de amor sôfrega, urgente e tumultuosa e o seu lábio tenha azedado por falta de beijo e mordida.
Dona Fatinha presta-se pouco a lirismos, já sabemos. Ganhou-lhes imunidade pela frequência do contacto, culpa da filha tonta que tem. E, de resto, não deve nada a ninguém, nem sequer boas maneiras. Entrega à cabeleireira o maço de cigarros pedido, faz o troco e um disparo seco:
 A idade está na cabeça, mas olhe que a burrice também.

2.9.25

Quando está pelos cabelos com o diabrete que concebeu, o meu vizinho precede as ameaças de castigo de um eu juro por deus que...O meu vizinho, criatura humana, pequena, sombria, pecadora, finita, uma entre qualquer número espantoso de outras, cujo peso sequer conta para o equilíbrio do universo, mau marido, amante incompetente, débil pai, oferece o criador como garantia dos seus atos. E há quem ache que eu desconsidero deus por diminuí-lo na grafia e levantar suspeitas sobre a sua idoneidade. Não há maior insulto a um nome do que usá-lo ao serviço de uma jura leviana.