Debaixo da minha janela de agosto, a desoras, passam conversas de um lado para o outro. Casais, amigos, famílias, amantes, adolescentes, companheiros de circunstância, sejam o que forem, têm enchido o meu bloco de notas destes comentários, cujo antes e depois se perdem com o afastamento e os rumores noturnos:
Podes vir tu, pode vir o presidente da república, pode vir o papa, pode vir deus, pode vir o caralho... olha, até pode vir a Cristina, que eu não vou mudar de ideias.
(supondo que a intenção fosse uma ordem crescente de poder, não tenho pensando noutra coisa: onde encontrar a Cristina?)
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Estou casada contigo há quinze anos e tu nada, nadinha, nunca! Nem uma tostinha mista me fizestes...
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— Na terra dos meus avós há uma ponte com mil anos.
— Nossa, que país maravilhoso esse Portugal, 'cês deveriam se orgulhar.
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Tu só tens de lhe perguntar: queres ou não queres? E a partir daí ele só tem duas opções: ou quer ou não quer. Isto parece muito básico mas é uma coisa que a maioria das pessoas não compreende.
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— Ó Beni, tu és do signo peixes, pois és?
— Sou, porquê?
— Então deves ter ascendente em piranha.
— Estupor, só não te parto a cara porque tenho pena de ti.
— Tu? Pena de mim?
— Sim, por seres touro com ascendente em corno manso.
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Olha, uma coisa que eu aprendi na vida é que um gajo só com a mulher não se sabe governar. Das duas, uma: ou tem uma boa mãe ou desenrasca uma amante.
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O meu filho tem muito boa índole, Sãozinha, e tu sabes. O que ele não gosta é de cumprir a lei.
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— A única coisa que uma pessoa precisa na vida é uma luz. Uma pessoa tendo uma luz encontra os caminhos todos.
— Uma luz? Em que sentido?
— Uma luz. Sei lá, uma luz, a tua luz, a que tu quiseres.
— Tipo uma religião?
— Ó pá, uma luz, não sabes o que é uma luz?
— Sei, mas há muitos tipos de luzes.
— Esquece, tu complicas muito.
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Estás outra vez com essa merda da conjuntivite? Não percebo, tudo o que te aparece de estranho, ou bem que é no olho de cima, ou bem que é no olho de baixo.
(muitos risos)