5.11.21

Aderimos com entusiasmo ao mercado de jogos, séries e filmes que respiram violência compulsiva e gratuita, de forma amplamente acessível e como entretenimento, viciando-nos, episódio a episódio, em enredos onde a cada passo se rouba, agride, inferniza, mata, destrói, manipula. Pagamos serviços de televisão que são passarelas de brejeirice, preguiça mental, comentário remunerado e cronometrado à medida da conveniência, e jornais que escolhem a dedo os títulos que mais nos adoecem e desesperam e que escancaram o abc do crime quotidiano e impune. Disciplinamos os nossos filhos sob o jugo desse mundo de euforia, sobrestimulação visual, folclore sonoro, falsa moralidade, que gera almas insones, ansiosas, surdas, depressivas e onde, embora parecendo o contrário, a intolerância medra com uma voracidade mortal. 
No entanto  como se nada disto importasse ou fosse  o normal, o velho e o novo normal, o aceitável e necessário normal, o normal onde cada corpo preguiça e paga a peso de ouro a sua concavidade , investimos as nossas sensibilidades, o nosso entendimento e a nossa indignação a censurar os trejeitos eventualmente machistas dos heróis da ficção clássica. Se é cegueira ou hipocrisia, não sei, mas dá no mesmo, porque das mãos de uma e de outra se alimenta o normal com igual apetite.

(o tema Bond já não ferve, eu sei, mas o meu hábito é chegar tarde)