6.8.21

A dor é uma bandeira de guerra. É legítimo agitá-la numa investida desapiedada sobre os seus causadores. E, no entanto, de bom grado teríamos evitado o banho de sangue. Mandámos sinais, avisos, disposição para ceder sem contrapartida o território onde já não temos interesses, vantagens, rotas nem comércios. Recusaram. Não era o território que nos queriam tomar, era a proximidade da raia, o rodeio quotidiano, o cerco que jamais avança ou recua porque evita perder ou ganhar, teme tanto a vergonha como o domínio. E por julgar que não disparando também não causam dano, mal imaginam que num dia vulgar, de humores insuspeitos, possam ser abatidos sem misericórdia com um único golpe. 
Talvez no futuro se lamente a desproporção do ato e muitos hão de perguntar que paz alcançamos com um desfecho assim. Acontece que a dor, sobretudo a que se faz de esquecida e não encontrou entendimento, vai ganhado o seu próprio senso de justiça e a sentença que dela vem acaba a ter mais crédito do que a dos tribunais e mais força do que a dos deuses. Nessa hora, que embora tardia não será vã, já nenhuma insegurança trava o golpe. E o tempo, para quem sacudimos a responsabilidade de todas as resoluções, passará a sua mão branda sobre as feridas e delas fará apenas mais uma de muitas histórias.