9.4.20

Da janela da cozinha vejo o ecoponto a tornar-se um lugar cada vez mais concorrido. Os automóveis encostam, abrem as malas e vão largando pilhas de excessos domésticos: caixas e caixotes, capas e pastas, brinquedos, sacos de roupa, mobiliário pequeno, abajures, molduras e uma série de quinquilharia que ao longe não distingo. É extraordinário o que há de sobra e inutilidade no topo dos armários, no fundo das gavetas, debaixo das camas, na sombra húmida das arrecadações. E tanta gente a realizar agora o que não faz falta, nem vale guardar, nem justifica o espaço que ocupa, o pó que acumula ou a energia que gasta. Eu tenho medo de qualquer coisa parecida: começar a notar, com clareza e sem ruído, aqueles cuja ausência afinal não cava no meu peito a saudade que eu previa.