4.1.25

Aguardo hoje que me venham entregar em mãos a notícia da tua morte. Mais hora, menos hora, há de chegar por mensagem escrita, os caráteres serão breves, o portador limitará o desfecho ao verbo fundamental. Ficas desde já a saber: de ti, ninguém me ouvirá dizer que eras um homem bom, que a tua morte foi um equívoco de deus, que as coisas à tua maneira vão fazer-nos muita falta, mais isto ou aquilo que se forja no adro das igrejas para dar causa e corpo às lágrimas. Não. Se tens de morrer, morre com direito à tua humanidade, morre defeituoso, cismático, arrogante, sôfrego e obstinado. Morre belo, terno, vertical e sem remorso.

(partem sempre demasiado cedo os homens que me amaram e não sei se essa tragédia é deles ou minha. No dia em que morra eu, algum me sobreviverá? Quem contemplará a imóvel transparência do meu rosto e dirá, em surdina, tão cheia de força e graça ela era, tão doce o mel colhido entre as suas pernas, quem contará estas e outras mentiras necessárias à edificação de uma biografia?)