Tenho pela escrita um amor estrutural, velhinho, genético, de que desfruto sozinha e em sossego. Nenhum outro se lhe pode sobrepor, dele tiro pão e prazer. Se me perguntam porque acontece assim, mal sou capaz de explicar e talvez essa seja a mais justa e honesta resposta a dar sobre o amor. Mas, confesso, escrever não me dá o gozo libertino, quase perverso, que sinto quando estou atrás das câmaras, a mexer no caldeirão onde são cozinhadas as mais impossíveis ilusões. A farsa, o efeito, manipular, transfigurar, construir, distorcer, fazer chuva, fazer sol, conceber um desejo e um desastre, abreviar o tempo, solucionar a desordem, implementar esse regime de ditadura sobre a visão dos outros, dar o ecrã como quem dá a vida inteira de modo a que não se note a ridícula dimensão do fragmento, enfim, contar uma historia em que tudo é verdade ainda que nada, rigorosamente nada, seja real.