30.1.23

Se paro, penso, diz a cabeleireira quando comento a genica com que a vejo esfregar os azulejos da entrada do salão antes das oito e meia. Será engano meu, que o frio, embora aguce o espírito, às vezes entorpece os sentidos, mas ia jurar que os seus olhos desesperam para se manterem à tona de uma devastadora onda de água e sal. Alguma coisa lhe dói e eu concordo que a dor é como as crianças buliçosas, há que lhes dar que fazer para que não se ponham a mexer onde não devem. Para todas as dores se encontra uma ocupação que sirva de terapia e com urgência a procuramos por sabermos já de cor que o silêncio e a quietude engrossam a voz com que ela fala dentro das nossas cabeças. Escutá-la é tortura e dá medo imaginar que o tempo não garanta a sua diluição. Dar aos braços ou às pernas, seja a desencardir azulejos ou a pedalar por trilhos e matagais, com menos ou mais estilo temos a ilusão de a enxotar ainda que, em boa verdade, façamos pouco mais do que enterrá-la fundo no coração