Julgo que as comadres resolveram as suas tricas ou naturalmente as esqueceram por não compensar a inimizade. Verdade seja dita, só uma provocava. E a outra, que me parece gente bem intencionada, nem se ocuparia a responder não fosse dar-se o caso de as alfinetadas serem ouvidas por outros. As provocações subtis, essas que deslizam num cumprimento cordial ou sob o disfarce de um largo sorriso, são as que mais cutucam os nervos e funcionam como imanes para quem não gosta de perder nem a feijões. Porém, se esperavam que um cavalheiro as levasse a dançar para as distrair daquele jogo de bem falante hipocrisia, correu mal. Diz-se que entre marido e mulher não se mete a colher, mas para um certo tipo de homens é entre mulher e mulher que convém ficar à margem e evitar tomar partidos, não vá a vida dar voltas que os levem ao regaço delas e é bom que então sejam recebidos sem mágoas para uma dança que lhes apeteça, seja minuete ou sarabanda.
Acontece que uma alma por natureza desassossegada precisa de transpirar muito durante o dia para, caindo a noite, alcançar alguma paz. E se destas duas comadres que se juntam à conversa nos salões há uma que só vai para se distrair das dores quotidianas, a outra espera dali genuína diversão e por isso investe muita energia a arrastar os folhos e os excessos do seu traje para trás e para diante, abrindo alas e impondo-se entre os pares dançantes, dando batidinhas com o leque nos ombros deste e daquele, tirando as medidas aos modos e às vestimentas, deixando um reparo aqui, outro acolá, sempre com a ideia de que é muito desejada a sua opinião e por isso dando-a como quem faz um favor e só por caridade não manda fatura. Acabará o dia certa de que por onde andou fez justiça, deixou a palavra merecida, avisou do que devia, pôs cada qual no lugar. Há de ser deveras cansativo ocupar-se a varrer os salões da freguesia com a cauda do vestido. E imagino que se não cair à cama por, enfim, ter o espírito apaziguado, cairá certamente por já não poder com um gato pelo rabo.