4.9.24

Gosto de ouvir as estagiárias na pausa para o café. Não estranho o ritmo frenético nem o facto de se darem muito ao relato e nada à reflexão. São inocentes disso. Vieram ao mundo nesta época em que opinar já não é atributo de consciência, dever de cidadania ou estímulo entre bons companheiros, mas um tacho remunerado ao minuto ou ao caráter. Ensinaram-lhes que o que basta é contar, mas que difícil se tornou fazê-lo sem mostrar! Se peço que me expliquem, espera, e recorrem a uma fotografia ou a um vídeo, porque as palavras rareiam e dão trabalho. Começam todas as frases por imagina, embora depois, que pena, haja pouco para imaginar. Imagina é o novo é assim, uma muleta introdutória de significância nenhuma, uma bagatela sintática, um adorno para preguiçosos. Vamos simplificar, dizem de tudo – e simplificando extinguem maravilhas, enigmas, tensão, dúvida. Com elas, o mundo ganhou competência e agilidade, mas perdeu mistério e matizes.
Apesar de tudo isto, como eu invejo a sua insensata urgência no porvir, os absurdos ideológicos formulados a partir de indignaçõezinhas miúdas, benignas e passageiras, o olhar bovino sobre as profundezas da realidade. Invejo o quanto sabem de mundos e linguagens que desconheço, invejo o sonho cuja impossibilidade ignoram e por isso perseguem, invejo a magnífica, tentadora visão da curva em que ainda irão despistar-se, as primeiras vezes de tudo o que têm por fazer. Invejo, ainda e sobretudo – pobre de mim –, que com uma carteira nova ou um par de sapatos tão bem remedeiem todas as dores da alma.